sexta-feira, 7 de junho de 2013

12 Cruzes - O Passado


A LENDA

Existe uma lenda que diz que, na Última Ceia, Jesus distribuiu doze cruzes relativamente pequenas, aos seus doze discípulos presentes. Apenas a décima segunda era ligeiramente maior e foi entregue a Judas. Com este acto Jesus mostrou já saber o seu destino e quem seria o traidor. Assim, Jesus foi crucificado e os doze discípulos guardaram as cruzes.
Quando Judas foi encontrado morto, um dos guardas tentou retirar a cruz que este trazia pendurada ao pescoço mas esta desapareceu das suas mãos, misteriosamente.
Ao longo do tempo, os restantes foram morrendo e as doze cruzes espalhadas por doze locais sagrados com um poder especial se reunidas…

O MOSTEIRO DE HEIKAN

A cidade de Kualtzar não é muito grande, quase todos os seus habitantes são religiosos e dedicam a sua vida a Deus. O mosteiro de Heinak era o clímax daquela região. Este erguia-se sobre a cidade com tamanha grandiosidade, que deixava deslumbrado qualquer visitante. Os quatrocentos e vinte degraus não eram apelativos, porém, a curiosidade, sobre o que se escondia dentro do mosteiro, atraía turistas que vinham sempre em grande número nos dias de visita.
As pessoas que tentavam de muito longe assistir ao que acontecia lá dentro por alguma das cento e quarenta e quatro janelas, deslumbrava-se pelo simples acto de verem uma ou outra freira que vinham à janela. Tamanho era o mistério que rodeava aquele lugar construído para adorar Deus.
Entretanto, dentro do mosteiro, um homem com uma batina preta, baixo, calvo e um pouco gordo, que aparentava não ter mais de quarenta e cinco anos, entra na sala do reverendo Synnath. Este era o responsável pelo mosteiro desde o falecimento do reverendo Cayhtn. O homem ajoelha-se perto do reverendo. Este, com uma aparência mais envelhecida dos sessenta anos que tinha, coloca-lhe a mão direita sobre a cabeça.
- Boa tarde, Emílio. – diz, retirando a mão.
- Boa tarde, Vossa Graça. – cumprimenta o homem ajoelhado.
- O que o traz cá? – questiona o reverendo.
- Venho pedir permissão para uma viagem. – diz, olhando o seu superior mais seriamente.
- Para uma viagem? - o reverendo levanta-se e olha por uma das janelas – Nesta altura em que treze famílias precisam de si? – questiona surpreso com o pedido do padre.
O padre aproxima-se do reverendo.
- É por essas famílias que parto. Treze famílias que ficaram sem os seus entes queridos… dos treze falecimentos, dez eram crianças…
- O que pretende com essa viagem? – pergunta o reverendo interrompendo Emílio.
- Reverendo… - o padre enche o peito preparando-se para o que ia dizer - eu sei que a Igreja é contra tal facto…mas eu estou disposto a reunir as doze cruzes de Cristo para ressuscitar…
A expressão de fúria do reverendo Synnath detém o padre de prosseguir a sua frase.
- Padre, espero sinceramente que esteja a brincar!
O padre Emílio olha para o seu superior confuso, o seu olhar frio destoava completamente dos olhares paternos que o reverendo costumava empregar ao dialogar ou observar todos os que faziam parte do mosteiro.
- Eu quero dar uma alegria àquelas famílias. – diz receosamente, sentindo-se intimidado. – O que aconteceu não foi vontade de Deus. Eles não deviam ter morrido.
- E para isso, Emílio, você está disposto a quebrar as regras da Igreja? A trair tudo aquilo que os nossos antepassados prezavam? A ir contra as nossas crenças?
O padre desvia o olhar por alguns segundos e depois volta a fixá-lo no reverendo. Desta vez não havia intimidação, apenas firmeza e determinação.
- Não, meu senhor. Simplesmente, não posso aceitar que estes seres humanos tenham sido levados, principalmente, as crianças. Foram treze pessoas mortas pelos demónios e não creio ser essa a vontade de Deus. Ele deu-nos o livre arbítrio de escolher, e escolher salvar a vida de quem não deveria abandonar tão cedo este mundo, não pode ser pecado. Nós somos os culpados destas mortes. Elas aconteceram por nós termos secretamente albergado uma das cruzes. A cruz apareceu no mosteiro, quem sabe se não apareceu pela própria vontade de Deus? E tal como nós escolhemos protegê-la. Creio que, não me podem culpar se agora escolher salvar a vida destes inocentes, utilizando o poder das restantes cruzes para isso.
O reverendo volta a sentar-se e olha para o seu súbdito com aparente introspecção. O padre esperou com expectativa que este falasse, já que, aparentemente, as suas palavras tinham provocado nela algum tipo de efeito. Até que o reverendo falou:
- Primeiro, nada nos garante que tudo não passe de uma lenda. A própria Igreja nunca admitiu nada disto. Mantemos as cruzes apenas para que estas não sejam capturadas pelos demónios que as querem destruir pois estes acreditam na sua própria lenda. Como bem sabe, padre, eles acreditam que se estas forem destruídas o Inferno descerá à Terra.
Em segundo lugar, as restantes cruzes estão guardadas em outros locais sagrados, até hoje só sabemos da existência exacta de doze, mas sabemos que existem muitos mais. Por último, nenhuma retórica que poderá usar, muda o facto de que o que pretende fazer é contra os dogmas da nossa Fé. Todas as pessoas que morrem, morrem por ser a sua hora, pela vontade de Deus. Deus traça os nossos caminhos, misteriosamente, temos de aceitar a Sua vontade e nos alegrarmos porque todos aqueles que morreram agora se encontram no Céu, certamente, servindo como Seus anjos.
O padre olhava para o reverendo, incrédulo, perante tal discurso. Como poderia uma criatura, que dizia servir a Deus, ser tão fria? Tão insensível? Como poderia usar a vontade de Deus como desculpa para o horror que tinha acontecido naquele lugar sagrado. Os demónios tinham profanado aquele lugar, tinham morto crianças e adultos apenas por prazer. Certamente, que Deus não tinha permitido tal coisa, não tinha originado uma morte tão cruel para aquelas crianças e aqueles adultos que as tentaram proteger. Apercebeu-se, que não tinha mais nada que fazer naquele lugar. Pois nada do que ele dissesse mudaria as ideias do reverendo. Acabou por se ajoelhar, sem tentar argumentar novamente, e fazendo a vénia saiu.


OS LOCAIS SAGRADOS

Porém, o padre Emílio não tinha desistido da sua ideia. A crença que tinha no valor da Vida, era maior do que o amor que tinha à sua batina se essa batina representasse os dogmas absurdos da igreja que um dia ele acreditara amar e servir em prol da Humanidade contra os Demónios. Mas a perspectiva da Igreja tinha de ser mudada, tinham de ser feitas novas regras, pois as que existiam estavam ultrapassadas para o tempo em que eles viviam e perante o perigo que representavam os Demónios. Claro que ele continuava a ter fé em Deus mas não na Instituição Católica.
Assim, um mês depois da conversa com o reverendo, Emílio largou a batina. A seguir, reuniu as famílias enlutadas e explicou-lhe o seu plano. Foi assim que, com a preciosa ajuda delas, conseguiu se apoderar da primeira cruz que ainda se encontrava no mosteiro e partiu em busca das restantes onze. No entanto, ele sabia os perigos que o esperavam. O Reverendo não iria aprovar essa sua rebeldia e efectuaria uma caça ao homem, não só para recuperar a cruz mas também para se vingar de Emílio, por ter ousado desobedecer às leis da Igreja. O antigo padre sabia que a partir daquele momento não poderia voltar atrás.
Além da cruz, Emílio roubara também o pergaminho que indicava as localizações dos doze locais sagrados conhecidos pela Igreja: A caverna de Sythern, os templos de Odys, Imbolc e Tundra, as Igrejas de Beltane, Alban Hefin e Lammas, o palácio de Samhain, as capelas de Cidra e Feill-Sheathain, a fonte de Ísis e o mosteiro de Heinkan onde já se tinha apoderado da cruz.
A sua cruzada tinha começado e o tempo não parou. Em ano e meio, Emílio reunira onze cruzes. Era um triunfo para o ex-padre reunir as cruzes em tão pouco tempo, visto estas estarem afastadas entre elas e os meios de transportes serem escassos e lentos naquela época. Mas quando chegara ao último lugar onde o pergaminho assinalava a existência da décima segunda cruz, na Fonte de Ísis, Emílio nada encontrou. E o seu coração bateu de desespero, perante tal acontecimento. Após tanto trabalho, tudo estava perdido, porque faltava a última cruz! O antigo padre estava desolado e desorientado. Porque ele não tinha ideia onde poderia estar a última cruz. Quem a teria levado e onde a teriam colocado? Teria a Igreja se antecipado a ele e escondido a décima segunda cruz para frustrar os seus planos? Até ali, tinha conseguido apoderar-se das cruzes com relativa facilidade. Além de que, conseguira sempre esquivar-se aos seus perseguidores, chegando mesmo a pensar que estava sob protecção divina. Então, por que razão agora aquela cruz não se encontrava ali? Onde poderia estar?


AUSTUS

Atormentado pelas suas suposições e pelas suas dúvidas, Emílio vagueara pelos locais próximos à fonte de Ísis. Até entrar numa taberna da pacata aldeia de Thassos.
- Que calma. Não é nada parecido com as tabernas que entrei nos outros locais em que estive durante a viagem, – pensara ele ao entrar e observar a decoração e a gente que ali se encontrava.
Na taberna, quatro homens jogavam às cartas, enquanto o empregado falava com um outro que segurava uma caneca de cerveja. Ao contrário dos outros locais, ninguém olhava para ele desconfiado por ele ser um estrangeiro.
Emílio sentou-se e colocou a mochila onde carregava as doze cruzes num banco junto dele. O empregado aproximou-se e perguntou-lhe o que este queria para beber ou comer. O ex-padre decidiu-se por um simples chá, ao que recebeu um sorriso do taberneiro que estava acostumado a servir bebidas mais fortes.
Entretanto, um vulto de negro entrou na taberna, olhou para Emílio e dirigiu-se ao balcão. O taberneiro serviu-lhe uma caneca de cerveja. Ele pegou nesta e encaminhou-se para a mesa onde o padre ainda descansava.
- Boa noite. – cumprimenta o desconhecido sentando-se na mesa – O que traz nessa mochila?
- O que é que isso lhe interessa? – pergunta Emílio desconfiado e ao mesmo tempo surpreso pela audácia do seu interlocutor que agora sorria aparentemente divertido.
- Acho que fui demasiado directo e nem sequer me apresentei. Chamo-me Austus e faço parte da igreja desta paróquia.
- Será que ele sabe que eu ando fugido? – interroga-se Emílio, ainda mais surpreso pelo que ouvia daquele homem em tudo curioso.
- O meu nome é Mensian, ando a viajar e dentro do saco trago recordações sem qualquer valor.
Austus sorri novamente numa mistura de divertimento e maldade.
- Eu sei perfeitamente quem é…Emílio Corratti.
Corratti abre os olhos em sinal de surpresa e observa Austus com preocupação.
- Então, se sabe quem eu sou para que está aqui? Para me dizer que me vai denunciar? – pergunta ele tentando aparentar calma, mas olhando de soslaio para ver as alternativas de fuja. As pessoas que os rodeavam não aparentavam estar atentas à conversa de ambos. Por isso, se fugisse, demorariam a perceber o que tinha acontecido.
Austus não largou o sorriso, reparando também em redor como se adivinhasse os pensamentos do ex-padre.
- Porque o faria?...Não, muito pelo contrário, eu estou aqui para o ajudar. O que está a tentar fazer é algo muito digno.
- Ajudar-me? Como? Você não me disse que fazia parte da igreja deste lugar?
Austus olha para ele misteriosamente e retoma o seu discurso.
- Eu sigo algo muito superior e, por isso, vou ajuda-lo – sussurra, tornando a sua voz menos audível, como se fosse contar um segredo que mais ninguém poderia escutar. – Você já ouviu falar da lagoa Alhmar?
- Sim, obviamente. A lenda conta que os demónios nadam nas profundezas dessa lagoa.
Austus sorri de novo. Bebe um pouco de cerveja, pousa a caneca e olha de novo para Emílio.
- Pois dizem…a Igreja diz…nunca desconfiou?
- De?
- Ser tudo uma história inventada?
- Por que haveria de o ser?
Austus levanta-se e aproxima-se do ouvido de Emílio.
- Porque assim a Igreja está certa de que ninguém encontraria as doze cruzes. Assim a luta ficaria reduzida à Igreja e aos demónios pois qualquer outra pessoa fora desse círculo temeria entrar na lagoa.
- A lagoa encerra imensos mistérios…. – conta retomando a palavra, - mas o maior de todos é nada mais nada menos que a cruz de Judas, que permanece lá escondida pois tanto a Igreja como os enviados de Satã sabem que lá estará protegida. Aliás, acho que, a Lagoa é o único local sagrado onde sempre esteve lá essa cruz, já que ninguém nunca a removeu desde que a descobriram… há muito tempo.
Emílio estava confuso e surpreso pelo que ouvia contar.
- A Igreja, eu compreendo que, não tivesse interesse em retirar a cruz. Porém, os demónios poderiam levar a cruz para o mundo deles, lá estaria mais protegida. Então, por que a deixam lá?
Austus percebia a confusão e tentou esclarecer ao seu ouvinte as suas dúvidas.
- A cruz de Judas é especial, muito poderosa. Ninguém a pode retirar sem ter em sua posse as restantes. Se algum demónio tocar nessa cruz será destruído, não sei se logo quando lhe tocar ou se depois, mas é esta a lenda.Além disso, as cruzes só podem ser destruídas se estiverem as doze reunidas, sozinhas são indestrutíveis. Os humanos quer sejam elementos da Igreja ou não, ao tocarem na cruz sem possuir as restantes, enlouqueceriam ou morreriam de uma morte aterrorizante. Na lagoa, a cruz está segura, pelo menos até alguém – e neste momento olha sério para Emílio – que já tenha as onze cruzes a tente resgatar.
Antes que Corratti pudesse fazer mais alguma pergunta, Austus levanta-se e sai da taberna. O antigo padre observa pela janela da taberna o estranho a desaparecer na escuridão, surpreso pelas revelações e curioso quanto à aparição daquele homem misterioso que do nada tinha aparecido e revelado a localização da décima segunda cruz. Emílio não sabia se devia desconfiar da sua sorte ou regozijar-se dela.

A LAGOA ALHMAR

Um mês depois Emílio chegou à lagoa. A lagoa era perfeita, límpida, demasiado apelativa, uma tentação. Seria uma tentação do demónio ou Austus teria razão?
Os gritos dos cavalos da sua carroça não o acalmavam perante a tarefa de mergulhar naquelas águas. Sem pensar mais tempo para pensar se tinha coragem ou não, atirou-se à água. A lagoa não era muito grande mas mesmo assim demoraria algum tempo a percorrer as suas profundezas. Além de que, necessitaria de muito fôlego e uma visão extraordinária. Para sua sorte, o céu estava límpido e o sol quente e luminoso. Se a água fosse tão límpida quanto aparentava não haveria problemas em ver o fundo daquele lago.
O tempo passou e anoiteceu. E com a noite veio a escuridão que fez Emílio desistir da sua procura. Preocupou-se antes em fazer uma fogueira para se aquecer.
Com a fogueira acesa, estendeu um cobertor no chão rochoso e sentou-se a comer alguns restos de pão recesso e carne seca que tinha trazido como provisão para aquela viagem. Após o seu pobre repasto, Emílio deitou-se na sua cama dura. Os pensamentos passeavam-lhe na mente não lhe dando a paz necessária para se largar ao cansaço que sentia. Tinha o corpo todo engelhado e frio do tempo que passara na água. E apesar da noite ser quente, nada o fazia sentir-se melhor. Apenas, talvez, abandonar aquele lugar inóspito e indiscutivelmente assustador de noite e procurar a luz convidativa de uma estalagem. Mas ele também não tinha dinheiro para pagar uma estalagem e tinha de começar o mais cedo possível no dia seguinte. Por isso, aquele lugar seria o melhor que tinha para dormir. Fechou os olhos, suspirando e pensou: Isto não é nada confortável. Ao longe ouviram-se gritos, gritos de dor, terríficos. O ex-padre encolheu-se ainda mais no seu cobertor. Animador pensou suspirando e perdendo o olhar no fogo. Resolveu pedir auxílio a Deus e rezou como não fazia há algum tempo. Nas suas rezas espelharam todos os seus medos e receios, mas também toda a sua esperança e o seu bom coração. Deus certamente olharia por ele e não deixaria nada de mal lhe acontecer.

A VOZ

Emílio pouco conseguiu descansar, os gritos da noite anterior, provenientes da floresta, ainda ecoavam nos seus ouvidos. Já tinha amanhecido e ele aproveitara logo para se lançar à água. Não poderia perder tempo, tinha de achar a décima segunda cruz e juntar às outras antes que algo terrível também lhe acontecesse.
Subitamente um objecto que brilhava, captou-lhe a atenção, Emílio aproximou-se e sorriu vendo a cruz pendurada num colar de ouro. Com cuidado pegou no colar, retirando a cruz e com ambos na mão regressou à superfície.
Saiu da água e secou-se, depois observou a cruz que tinha colocado sobre a mochila para ela não desaparecer ou lhe acontecer algo terrível. Junto das restantes onze, nada poderia acontecer-lhe, segundo o que lhe contara o homem misterioso da taberna. Pegou delicadamente na cruz e reparou na sua diferença. Esta não era como as outras onze, era um pouco maior e tinha o símbolo XII gravado na madeira, as outras eram simples, sem inscrições ou numerais. Por isso, eram passíveis de ser confundidas com cruzes normais, como as que os monges do seu antigo mosteiro faziam para venderem aos visitantes. Aliás fora essa arte, que lhe permitira sobreviver durante toda aquela sua cruzada. Emílio era um óptimo artesão e esculpia cruzes em madeira com mestria, tal como pequenos santos e santas, que depois vendia aos fiéis à saída de alguma igreja ou então em alguma feira de alguma cidade que visitava.
Sem perder mais tempo, juntou as doze cruzes e com elas montou uma cruz maior. Espero que a as histórias que ouço estejam certas, formei a cruz de Cristo, agora só tenho que esperar.
- As doze cruzes que no passado serviram para matar servem agora para ressuscitar. Diz-me, quem são os doze que desejas que voltem à vida?
Emílio ficou sem reacção, aquela voz era tão forte, sentia nela um poder imenso, seria a voz de Deus?
- Quem fala? – Questiona não aguentando a curiosidade.
- A essa pergunta não posso dar resposta. Faz o teu pedido.
Emílio olhou para o chão consternado com a resposta da voz.
- Percebi bem? Apenas posso ressuscitar doze pessoas?
- Sim, uma por cada cruz e só uma vez. Ninguém pode ser ressuscitado duas vezes.
- Tu és só uma voz?
- Eu sou algo díficil de entenderes. Faz o teu pedido.
Foram treze pessoas que morreram, como posso escolher? Eu não me sinto capaz…não quero deixar ninguém sem salvação.
- Por vezes, difíceis escolhas têm de ser feitas. – afirma a voz.
Emílio olhou para o chão. Terá que ser assim.
- Eu quero ressuscitar doze pessoas das treze que morreram no ataque de demónios na cidade de Kualtzar há um ano e meio. Não ressuscites o mais velho de todos.
Emílio deixou-se cair de joelhos no chão como se senti-se derrotado.
- O teu pedido foi concedido. – diz a voz.
Uma luz envolveu Emílio desvanecendo-se em seguida. O antigo padre olhava para as cruzes enquanto estas desapareciam uma a uma, e depois, o silêncio absoluto reinou.

AZAZEL

A noite chegou, Emílio ainda recuperava de tudo aquilo e decidira permanecer mais uma noite perto da lagoa, subitamente, no meio do céu surgiu Austus, a sua expressão era de raiva.
Ele voa? – Emílio não conseguia acreditar no que estava a ver.
- Não! Cheguei demasiado tarde! Estúpido humano! Arruínas-te tudo! – gritava Austus, enquanto descia na direcção de Emílio.
- Como pudeste usar o maldito desejo? Quase dois anos à espera que as cruzes estivessem reunidas para as destruir…vai demorar tempo a encontrar alguém tão idiota como tu. – Diz já pousado no chão.
Emílio olhava para ele totalmente confuso.
- Por acaso sabes quem eu sou? – Uma luz vermelha circundou Austus enquanto este se erguia de novo no céu, em poucos segundos aquele estranho homem transformou-se em um ser vermelho, com olhos de chama, cornos e asas. Emílio quis beliscar-se para ter a certeza que não era um sonho mas não havia tempo para isso.
- Eu sou Azazel! Filho de Lilith e Satã, eu sou o príncipe do Inferno! – exclama furioso.
- Iblis?
- Iblis é como a Igreja me conhece, Iblis era antes de eu me tornar tão poderoso como o meu pai.
- Porque me ajudaste a encontrar a cruz? Já sabias onde ela estava, podias ter-me roubado as outras onze e ter vindo buscá-la.
- A água da lagoa é sagrada, nenhum demónio pode entrar lá dentro.
- Então…a história que me contaste?
- É, em parte, verdade, só te ocultei este facto. Não existem demónios nas profundezas, são histórias da Igreja para afastar curiosos.
- Afinal a Igreja conhece treze locais sagrados…mas no pergaminho…
Azazel foi-se aproximando.
- Os segredos da Igreja não estão em papéis. Mas, basta de conversa!
Azazel ergueu Emílio no ar, e com as suas garras apertou o pescoço deste.
Aos poucos Emílio foi perdendo as forças e acabou por fechar os olhos quando a morte o veio buscar.
Apesar da morte do corajoso Emílio, os seus feitos não foram esquecidos. Emílio guardava um diário, e as suas jornadas estavam lá relatadas até ao dia em que encontrara a décima segunda cruz. O diário foi encontrado e a história dele contada.
Os doze ressuscitados criaram a legião Alhmar em honra de Emílio Corratti e prometeram lutar contra os demónios e contra as regras da Igreja, e reunir as doze cruzes quando fosse necessário. Em um apontamento deixado na parte final do diário, Emílio pedia para não ser ressuscitado se morresse naquela aventura, achava-se indigno de tal. A sua vontade foi feita mas o seu nome foi recordado para sempre e por isso tornou-se imortal, mas a luta ainda estava no início, porque das profundezas das trevas, Austus esperava.

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