sexta-feira, 21 de junho de 2013

                                                IV

O carro conduzido por Maria havia arrancado a alguns minutos, no ar ainda se sentia o cheiro a motor. A tristeza assolava todo o rosto de António. Nas ruas viajava um silêncio perturbador, as pessoas numa mistura de ódio e angústia passavam por ele sem dirigir qualquer palavra. Uns porque o achavam responsável daquilo que o filho fez, outros porque apesar de não acreditarem que o seu filho fosse culpado não sabiam o que dizer. O homem parecia ter envelhecido demasiados invernos nos últimos dias, a atitude energética havia sido substituída por um sentimento de desânimo.  Era o primeiro dia sem o seu filho, depois daqueles dias demasiado grandes entre o dia em que o seu rebento tinha sido acusado e julgado.

Algumas horas de viagem depois, finalmente Miguel chegava ao seu destino. A casa que o ia receber era portentosa, com mais janelas e divisões que uma pessoa podia contar. Pintada de branco fresco denunciava os seus poucos anos de existência. O rapaz foi levado pelo motorista e pela responsável da acção social até à porta da cor do fruto do castanheiro. Uma senhora avançada em idade, de pernas trémulas e engelhadas cumprimentou as visitas.
- É ele? – questionou num tom de voz combalido – É o novo?
- Sim. – respondeu a profissional da acção social – Fica aqui a partir de hoje. Nós vamos indo.
Miguel observou o carro a arrancar dali virando-se depois para a velha.
- Não te preocupes meu rapaz, serás muito feliz aqui. Vou mostrar-te o teu quarto. Terás três companheiros. Nunca te sentirás sozinho. Além disso, o senhor Jorge, responsável deste espaço é uma excelente pessoa que providenciará tudo aquilo que tu precisares.
O rapaz em passos tímidos entrou naquela casa arregalando os olhos de espanto tal o tamanho do salão principal.
- É enorme não é? – sorriu a idosa – É necessário. São mais de cem crianças.
Subiram umas escadas de madeira que pareciam deslocadas daquela casa, tinham um aspecto antigo e rangiam a cada passo. A mulher parou junto a uma porta e fez-lhe sinal para entrar.
- Aqui será o teu quarto. O Guilherme, o Nuno e o Vasco estão aí dentro. Pousa as tuas coisas e aproveita para os conhecer.

Miguel entrou sozinho, a porta foi fechada nas suas costas. Três rapazes estavam sentados na mesma cama, a conversa animada foi interrompida pela chegada do rapaz novo. Miguel levantou a mão direita e soltou um envergonhado “olá”. Um deles saltou imediatamente da cama e encaminhou-se para ele.
- És tu o forte não és? – interrogou em tom de escárnio – O que violas raparigas indefesas.
O jovem ficou atrapalhado sem saber o que dizer.

- Eu sou o Vasco. – disse o miúdo que se tinha aproximado. – Que fique claro que eu não gosto de ti e que vou fazer da tua vida um inferno!

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