quinta-feira, 27 de junho de 2013

                                                                          V


O quarto onde tinha ficado Miguel, era enorme. Cada um dos quatro rapazes tinha a sua cama, tapetes um pouco desgastados preenchiam o chão, ao lado de cada cama uma pequena mesa com uma imagem de Nossa Senhora de Fátima. As gavetas que cada mesa tinham serviam para os mais novos guardarem os seus pertences e as suas coisas, mas tinham que ter cuidado com o que escolhiam para lá deixar pois eram revistados todos os dias. A parede tinha apenas um quadro que mostrava um pastor a tentar controlar as suas ovelhas, preto e branco. Sem rádio. Sem televisão. Sem nenhuma distracção.

Miguel abriu os olhos de modo preguiçoso, os seus ouvidos ainda demoraram alguns segundos a assimilar as palavras da senhora Madalena. A idosa batia com uma panela contra outra panela exigindo que os quatro ocupantes daquele quarto acordassem.
- Vamos lá, jovens! São horas de acordar!
O rapaz observou os outros três companheiros de divisória a levantarem-se num ritmo muito mandrião. Porém, assim que a velha ameaçou chamar o senhor Jorge, todos eles sem excepção aceleraram as suas acções. A senhora Madalena saiu para continuar o seu serviço de despertar.
- Vamos. – disse Vasco – Temos que estar na mesa daqui a pouco.
- Esperamos por ele? – questionou Guilherme – Pelo Miguel?
- Nem pensar. – respondeu Vasco subindo o seu tom de voz para ter certeza que Miguel ouvia – Ele que se lixe.
- Vamos lá então, senão o senhor Jorge fica furioso – alertou Nuno – E é a última coisa de que precisamos.

Os três saíram do quarto, Miguel saiu da cama e começou a vestir-se. Ao longe continuava a ouvir o barulho das panelas. Não fazia ideia das horas, olhou à sua volta e não havia por ali um relógio sequer. Subitamente, um barulho alertou-o para a porta, virou as suas atenções para lá e pareceu-lhe ver um vulto a desaparecer de repente. Não desviou os olhos da porta, sabia que estava ali alguém. Os cabelos negros, longos e desalinhados denunciaram uma rapariga, dos seus aparentes dez anos. Ela, de olhar esverdeado amedrontado e rosto sujo, espiava o jovem.
- Quem és tu? – perguntou Miguel – O que é que fazes aqui?
A rapariga não respondeu. Mas não foi preciso esperar muito tempo para que o rapaz ficasse a conhecer o nome dela. Vindo do nada, um senhor balofo e bigode esticado apanhou a miúda pelas orelhas.
- O que é que já te avisei, Vânia? – interrogou o homem – Quantas vezes vou ter que te repetir que não te quero a andar pelos corredores?  - de seguida, o homem fixou o seu olhar em Miguel – E tu! Já são mais que horas de estares na mesa! A tua sorte é que é o teu primeiro dia senão haveria castigo.

Assim que o homem saiu com a rapariga, Miguel sentou-se na cama atordoado com toda aquela estranha situação. Assim que se recompôs acabou de vestir-se e foi para a mesa de pequeno-almoço. 

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