II
As gotas de chuva que soavam nas janelas anunciavam
o dia seguinte à tempestade. O chão daquele quarto estava infestado por puzzles
de roupas espalhadas por todos os locais possíveis. Na porta semiaberta entre o
quarto e a sala um pequeno gato branco e de pelos enrolados miava sem descanso.
A mesa de trabalho estava completamente desarrumada com papéis à deriva, o pc
tinha-se entrado em suspensão automática depois de reproduzir diversas listas
Spotify. As roupas misturavam-se no chão anunciando uma noite de paixão. O
despertador tocou. Ela esfregou os olhos, olhou para o seu companheiro e
suspirou, de seguida parou o despertador e começou a recolher a sua roupa do
chão para se vestir. Fez uma carícia no gato e dirigiu-se à cozinha, colocou
uma tigela de whiskas no chão para o seu animal de estimação, serviu-se um café
e fumou um cigarro para relaxar. Procurou o seu telemóvel no meio da confusão
do quarto e assim que o encontrou assustou-se, mais de uma dezena de chamadas
perdidas de António, o seu irmão António Carvalho. Ela, Maria, vivia na cidade,
a alguns quilómetros da vila, porém apesar da proximidade os dois mal falavam.
- António? – disse mal ouvi um olá tremido do outro
lado – O que aconteceu?
A situação foi explicada rapidamente. O seu sobrinho
havia sido acusado de violação. A esperança de António recaía em Maria, sua
irmã, advogada, as diferenças entre os dois tinham que ser postas de lado pelo
bem de Miguel. António contou tudo em lágrimas, como Fonseca, gnr natural da
vila e já perto da reforma, apareceu na loja de pesca, o que ele disse, como
ele prendeu Miguel perante o espanto de António. O desespero do filho enquanto
era arrastado pelo velho conhecido Fonseca gritando que não tinha feito nada de
mal.
Maria dirigiu-se à casa de banho e tentou-se
recompor, a chamada tinha-lhe roubado algumas lágrimas. De seguida encaminhou-se
até ao quarto e chamou por Marco, seu companheiro de cama.
- Vamos, levanta-te! – exclamou ela – Tenho que
sair.
- O quê? – exclamou ele confuso e ainda cheio de
sono – Tão cedo?
- Provavelmente vou ficar uns dias na vila.
- Assim de repente?
- Marco, Marco…- sorriu ela abeirando-se dele –
Pensei que isto estava claro – roubou-lhe um beijo – Não te devo satisfações
nenhumas. Isto é só sexo.
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