sexta-feira, 14 de junho de 2013

Culpado - Parte III


III

O olhar de Miguel misturava tantos sentimentos, surpresa, medo, revolta, tristeza. Tudo aquilo parecia ser filmado em câmara lenta, era levado para dentro de um carro como se fosse um criminoso, mas que erro tinha ele cometido?  Observou todos os que o rodeavam, começou por Lara que assim que notou o olhar de Miguel desviou o seu rosto, notava-se o sofrimento da rapariga e o filho de António questionava-se no porquê de Lara ter feito o que fez, não havia resposta que o convencesse. Perto de Lara estavam vários familiares da rapariga que o insultavam, dois primos ainda tentaram atingi-lo porém os guardas não o permitiram. Imediatamente ao lado de Lara estava o pai da rapariga, homem de aparência soturna, alto e magro, barba feita e relógio rolex no pulso, o seu rosto denunciava um sorriso saciado. Do lado oposto da rua estava o pai António, que não controlava as suas lágrimas apesar do abraço sentido da sua irmã Maria. Depois da morte da sua mulher, derrotada por uma doença prolongada, o dono da loja de artigos de pesca enfrentava novo sofrimento. Mais afastado estava o senhor Manuel, o dono da loja de recordações na sapiência da sua idade refutava os argumentos do jovem Diogo, seu filho, que o tentava convencer que Miguel era culpado. O pai de Diogo conhecia Miguel desde pequeno e não tinha dúvidas da sua inocência. Porém, apesar de todos os esforços de Maria, o veredicto do júri culpou Miguel. O filho de António partia da vila para uma casa de acolhimento na cidade. Acabavam-se as tardes de pescaria, as corridas a pé pelos atalhos da vila com os amigos, os mergulhos no mar, os jogos de cartas inventados pelo Chico ao final da tarde, as leituras no jardim, a bola de carne da senhora Graça e as brincadeiras do senhor Carlos, o dono do café onde Miguel parava desde criança.

O rosto de António estava cansado, desde que o seu filho fora acusado de violação que o homem não pregara olho. A esperança em Maria tinha acabado, apesar da irmã ter tentando de tudo o seu filho estava a ser retirado dos seus braços sem que este pudesse fazer nada. Sabia que o seu filho era inocente, era um amor de rapaz, trabalhador e obediente.

O carro arrancou, Miguel em lágrimas olhou para trás, ignorou os insultos de algumas pessoas e concentrou-se na sua família. Mal tinha partido e as saudades já o invadiam. O que o esperaria?
- Anda. – pediu Maria – António, temos que ir.
- Eu quero o meu filho. – afirmou o irmão a tremer – Quero o meu filho.
Ainda com os gritos de “violador” a ecoarem na sua mente, o dono da loja de artigos de pesca deixou-se cair no chão sem forças repetindo “é mentira”.
Maria abraçou-o.
- A justiça será feita – sussurrou.

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